domingo, 3 de abril de 2011

Terry Jones, o mundo não-cristão e a queima do Alcorão - Parte II

Por Luciano Borges de Santana

As críticas contra Jones prosseguiram ao longo do dia 09/09/10. O ministro do Interior da Índia, país que é palco de um lamentável conflito religioso entre muçulmanos e hindus condenou a queima do Alcorão. Pressionado, Jones afirmou até reconsiderar seu plano, caso a Casa Branca, o Pentágono ou o Departamento de Estado entrasse em contato com ele. Instituições e personalidades pelo mundo manifestam suas preocupações, como Nasim Rehmatullah, vice-presidente da comunidade Ahmadi (grupo muçulmano), que ironicamente chegou a afirmar que "aqui, nos Estados Unidos, não queimamos livros". O senador John McCain, candidato derrotado por Obama nas eleições presidenciais também solicitou para que Jones desistisse de seus atos. A Interpol por sua vez alertou seus países membros sobre possíveis atentados que poderiam ser praticados por grupos radicais muçulmanos. Preocupados com a repercussão negativa das atitudes de Terry Jones, a empresa que hospedava o site de sua igreja, se sentiu na obrigação de suspendê-lo temporariamente, devido ao conteúdo que poderia estimular a violência. Muçulmanos ao redor do mundo avaliam de forma negativa a campanha de Jones e questionam como um país que apregoa os ideais de liberdade, iluminismo e tolerância tenha chegado a tudo isso. E, pressionado pelo desenrolar dos acontecimentos, o governo dos EUA deixa escapar em entrevistas coletivas, que havia uma forte possibilidade da Casa Branca convocar pessoalmente o pastor a desistir de seus planos. No final do dia 09/09/10, Jones finalmente afirmou que tinha desistido de queimar os exemplares do Alcorão, supostamente após ter entrado em contato com os líderes muçulmanos que estavam por trás da construção de uma mesquita e um centro cultural islâmico na área onde ficava o antigo World Trade Center. Um porta-voz do imã Feisal Abul Rauf, rejeitou que havia sido feito qualquer acordo para mudar o local dessas construções. Ainda no final desse dia, o secretário americano de Defesa, Robert Gates entrou em contato por telefone com Terry Jones, reforçando o perigo que as forças armadas dos EUA estariam passando, principalmente no Afeganistão e no Iraque, caso a proposta fosse levada adiante. E para a surpresa geral, Terry Jones, que havia entrado em contato com o imã de Orlando, Mohammed Musri, acaba sabendo que a suposta mudança de local do centro cultural islâmico e da mesquita não seria efetivada. Desiludido, Jones afirma que "agora há uma suspensão provisória do evento planejado, porque neste momento estamos verdadeiramente decepcionados e chocados. Se isto é certo, ele (Musri) mentiu muito claramente... Somos obrigados a reconsiderar nossa decisão, porque ela era baseada em sua palavra. Entendo que agora estão recuando e dizendo que não é nada disto." O mundo começa a se preocupar novamente.
Devido ao impasse do dia anterior, o dia 10/09/10 começa com muita apreensão pelo mundo. Diversas autoridades como o presidente do Afeganistão, Hamid Karzai, o presidente da Indonésia, Susilo Bambang Yodhoyomo e o primeiro-ministro israelense, Benjamim Netanyau, manifestam suas preocupações, enquanto diversos manifestantes protestam no Afeganistão. Definitivamente Terry Jones desiste de queimar os exemplares do Alcorão, mas o balanço do dia é extremamente negativo com a morte de um manifestante e outros feridos no Afeganistão. Na esteira da crise, o presidente iraniano Mahmud Ahmadinejad afirmou que tudo aquilo não passava de um complô "sionista". Já o imã de Meca, Saleh Bin Humain, considerou que a queima de exemplares do Alcorão não passava de "terrorismo". O arcebispo de Nova York, Timothy Dolan chegou a declarar que o dia 11 de setembro "não é um dia contra os muçulmanos, nem um dia de ódio, e sim de amor, fé, esperança e oração." Terry Jones ainda nutrindo ressentimentos, questionou o imã de Nova York sobre a mudança do local das construções próximas ao antigo World Trace Center. Ele intimou o imã a se declarar em 2 horas sobre o assunto, atraindo mais ainda publicidade para sua igreja e a pacata cidade de Gainesville. Após o fim do ultimato, o imã de Nova York não respondeu as exigências de Jones e sua filha, Emma Jones, que vivia afastada do pai na Alemanha, simplesmente disse que "como filha, vejo uma boa pessoa nele, mas acho que ele precisa de ajuda. Acho que ele enlouqueceu." No final do dia 10/09, quando fontes ligadas a Jones confirmam a desistência dos planos sobre a queima do Alcorão, o pastor viaja para Nova York para se encontrar e discutir com o imã de Nova York, o polêmico projeto das construções muçulmanas. Para diversos analistas, Terry Jones que era um desconhecido alcançou uma maior popularidade devido a reação da Casa Branca, impulsionada pela internet e as mídias virtuais.
Apesar de ter novamente confirmado no dia 11/09/10, em entrevista a rede NBC, que "definitivamente não queimaremos o Alcorão, não... Nem hoje e nem nunca", diversos protestos são realizados, principalmente no Afeganistão. Devido ao pouco interesse da mídia pelo caso após o 11/09 o nome de Terry Jones apareceu poucas vezes na imprensa, quase sempre associado a atos de fanatismo, vandalismo ou intolerância religiosa. Em dezembro de 2010, Jones volta a ser noticiado pela imprensa, após receber um convite de uma organização inglesa, para discursar sobre os aspectos negativos do Islã e o perigo que representava uma islamização da Europa. Em janeiro de 2011, Jones "reaparece" na imprensa, novamente associado à intolerância religiosa. Sua proposta agora seria a criação do Dia do julgamento internacional do Corão, a ser celebrado em 20 de março. Em um vídeo postado no Youtube, Jones afirma que "o Corão é o acusado. Nós estamos acusando o Corão de assassinato, violação e de ser responsável por atividades terroristas ao redor do mundo. Estamos acusando o Corão desses atos violentos". Incentivou os apologistas do Alcorão a defender o livro: "Desafiamos que o façam. Não falemos, queremos ver ação e que nos demonstrem. Venham nos demonstrar nesse dia, 20 de março, o dia que o Corão será julgado. Nós teremos um juiz, vamos chamar testemunhas e vocês podem chamar testemunhas. Desafiamos vocês. Da última vez vocês, os islamitas, demonstraram ter uma boca muito grande. Falaram muito e seguiram falando para dizer o quão pacífico era o Corão. Bom, venham e demonstrem". Afirmou ainda que se o Alcorão for declarado culpado poderá ter três castigos: "ser queimado, se essa for a vontade das pessoas, afogado, picado ou fuzilado". Na ocasião, o discurso extremista de Jones não teve a repercussão do ano anterior, mas quando decidiu viajar para a Inglaterra, teve a entrada negada no país pelo Ministério do Interior, devido as pressões de entidades e cidadãos. O governo britânico alegou que "se opõe ao radicalismo de todas as formas".
O tempo passou e Jones foi novamente esquecido. Mas, em 21 de março de 2011, a imprensa mundial ainda impactada pelo terremoto que abalou o Japão, voltou a colocar Terry Jones sobre os holofotes. No dia anterior, a igreja de Jones na cidade de Gainesville, na Flórida, "testemunhou" o Dia do julgamento internacional do Corão, onde o livro de acordo com o julgamento de Jones foi declarado culpado por vários crimes, entre eles o de assassinato. O livro foi molhado com querosene e em um recipiente queimou por 10 minutos. Jones satisfeito, disse que o evento é uma "experiência daquelas que temos uma vez na vida". A reação no mundo demorou a aparecer devido ao sofrimento do povo japonês pelo terremoto que atingiu o país. Protestos seguiram-se alguns dias depois, a imagem dos EUA fora manchada pela intolerância religiosa e potenciais grupos terroristas muçulmanos ficaram revoltados com o atentado realizado contra seu livro sagrado.
Qual é o balanço que podemos fazer das atitudes promovidas por Terry Jones? Será que ele agiu como um verdadeiro pastor, um líder da causa do Mestre? Como você avalia o testemunho de uma pessoa que tinha abertamente afirmado que em ocasião alguma queimaria o Alcorão e meses depois pratica o que antes tinha evitado. Talvez você me censure por ter tão detalhadamente esmiuçado as propostas de Jones entre 2010 e 2011. Talvez me questione por ter ignorado que a mídia, de forma geral, não simpatiza com os princípios cristãos e para ela, inflar o comportamento de Jones renderia uma enorme audiência; ou até mesmo agora esteja me ridicularizando por desconhecer que Bíblias cristãs também foram queimadas ao longo da história da igreja, e países árabes ou governos de ditaduras comunistas proíbem a livre impressão e circulação da Palavra de Deus em seus territórios. Não, caro leitor, eu não ignoro nenhuma dessas coisas. Mas, não estou nesse momento tratando disso. Eu reconheço plenamente a oposição que a imprensa, os governos árabes ou qualquer ditadura comunista faça não apenas contra a Bíblia, mas também contra aqueles que assumiram o compromisso de honrar essa Palavra. Essa oposição inclusive, foi reafirmada por Jesus (Jo. 15.18-19) e não causa espanto algum saber que ela existe. Mas, se você voltar à primeira postagem, verá que no início do artigo discuti o perigo que os escândalos podem trazer à igreja e a expansão do evangelho de Cristo. É isso o que procuro avaliar. Diante de toda a comoção mundial provocada pelo extremismo religioso de Terry Jones, pessoalmente preferiria que ele nunca tivesse feito isso, pois suas atitudes só prejudicaram a obra de Deus.

Nenhum comentário: